(Texto redigido exageradamente para a disciplina de Criação de Texto)Dessa vez não poderia ser diferente. E seria uma atitude verdadeiramente tola acreditar nisso. Confiem: já tentei. Desde que me conheço por gente, ensaio malabarismos admiráveis para driblar e confundir a minha mente. Já fiz mil promessas para o meu coração e para minha alma; promessas tão convincentes que cheguei a acreditar na minha própria mentira. Jurei que daria uma chance ao amor. De pés juntos, que permitiria a entrada da felicidade. Bom, é claro que quebrei todos os juramentos, preces e comprometimentos comigo mesma. A verdade é que, desde sempre, mesmo que inconscientemente, boicoto o que é promissor em minha vida afetiva. Encontro defeitos, invento problemas, incentivo minha louca racionalização e construo graves generalizações. Por medo? Não, não, não. Fujo do padrão que sempre segui em minha vida, da repetição de acontecimentos frustrantes e tento escapar das possíveis semelhanças que vejo serem instaladas em cada um dos meus relacionamentos. Pensando melhor, talvez seja por medo, sim. De quê? Ah, não respondo perguntas difíceis (é por isso que vamos à terapia e, justamente pelo mesmo motivo, desistimos dela quando percebemos quantas perguntas a mais surgiram em nossas vidas desde que começamos a questioná-la). Admito: sigo um padrão quando o assunto é ‘escolha amorosa’. Confesso que antes mesmo de iniciar um relacionamento, já penso em como será o dia em que eu tiver que dá-lo por encerrado. Elejo pessoas que, lá no fundo, sei que não servem para mim e que, eventualmente, sairão da minha vida. Aliás, só me envolvo com homens com os quais tenho certeza que não vai dar em nada. E o pior: sofro a cada término. Já fui acusada de ter um sério desfalque de amor próprio e auto-estima. O bem da verdade é que já duvidei da minha capacidade de amar. Tão jovem e tão egoísta! Onde já se viu? Querer amor e não saber reproduzir, cultivar ou reconhecer esse sentimento. E, principalmente, vivê-lo. Dessa vez, achei que realmente pudesse ser diferente. Ele não é viciado em drogas, não bebe ou fuma, não ultrapassa o limite de velocidade e abre a porta do carro. Um cara bacana, médico, bonito, viajado e culto. E aí, penso: qual será o grave defeito? Provavelmente, nada de outro mundo. Talvez ele não recicle, ronque, goste demais de futebol ou fale alguns palavrões de vez em quando. Novamente: nada de mais. Certa vez ouvi dizer que “as pessoas poderiam vir com avisos. Nada constrangedor. Apenas umas letrinhas discretas, que evitassem confusões e dúvidas sem fim”. E como ele parecia ter caído do céu, eu mesma tomei as rédeas e resolvi destruir a quimera, antes que ele se mostrasse ser perfeito para mim. Comecei a me afastar, a suspeitar (porque quando a esmola é demais, o santo desconfia) e a interpretar tudo que ele fazia ou falava da forma que eu bem entendia. A verdade é que homem não se interpreta; não existem mensagens nas entrelinhas. É simples, preto no branco. Passei a dizer que, como das outras vezes, com ele não seria diferente. Logo, iria se revelar ciumento, obsessivo e chato. Cedo ou tarde iria pular algumas cercas - e isso eu não suportaria. Esse é o problema de nunca ter sido traída antes. Vejo quanto sofrimento vem à tona e quanta mágoa paira para sempre no coração. Prefiro pensar que todo homem é igual e todos vão fazer o que o Paulo, Roberto, Ricardo e João fizeram. Não importa o nome, RG ou CPF: homem é homem e ponto final. Agora, como não ter sua autoconfiança abalada? Como fechar os olhos e se entregar? A pulga atrás da orelha, o pé-atrás e o medo sempre vão te fazer companhia. A dúvida e o receio de reviver alguns episódios passados fazem com que mulheres como eu fujam a qualquer sinal de felicidade. Buscamos, então, homens com características semelhantes às de sempre: aqueles com quem sabemos que vai dar errado. Aqueles com os quais não criamos expectativas.
Um belo dia, quando a pessoa certa finalmente aparecer, fugiremos dos conselhos de Clarice Lispector e não estaremos distraídas o suficiente para relevar os pequenos pecados, as sutis diferenças. Estaremos atentas e sem expectativa. O pobre coitado não terá uma sombra de chance. Talvez, ele nem seja a pessoa certa (e não precisa ser); apenas uma alegria para os finais de semana e para as carências dominicais. Quiçá, uma agradável companhia para tomar um café numa tarde fria ou uma mão a ser trançada durante uma sessão de cinema. A verdade é que morremos de medo de amar. E assim, vendamos nossos olhos e distanciamos qualquer fração de sentimento. Por medo. Por medo de perceber que, talvez, dessa vez, poderia ser sim, diferente.